Resenha: "Letramentos múltiplos, escola e inclusão social"
RESENHA
Obra:
ROJO,
Roxane. Letramentos múltiplos, escola e
inclusão social. São Paulo: Parábola
Editorial,
2009. 128 p.
Resenhado por:
Marcos José de
Oliveira Silva
marcosjose4230@gmail.com
Rosenéa Pereira
nea.rosa@hotmail.com
No livro Letramentos Múltiplos, Escola e Inclusão
Social, Roxane Rojo, doutora em Linguística Aplicada pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), faz uma discussão sobre as
concepções de alfabetização, alfabetismo e letramentos, problematizando as
relações entre exclusão social e insucesso escolar, os números e dados da
educação básica, os níveis de alfabetismo e as práticas sociais de uso da
leitura e escrita. A obra, que está dividida em seis capítulos, além do debate
levantado, é também um encaminhamento pedagógico, tendo em vista as propostas
de atividades sugeridas pela autora para serem utilizadas em salas de aula
pelos(as) professores(as).
Os questionamentos que
Roxane Rojo faz ao longo do livro nos levam a perceber a variedade de aspectos
culturais que se apresentam no ambiente escolar e a compreender as múltiplas
formas que possuímos de ler e escrever, as quais transitam e se modificam em
diversos ambientes e tempos. Naturalmente, o texto é um convite a dialogar com
as nossas formas de ler o mundo e de produzir conhecimento.
A autora nos interpela
a pensar a educação de forma ética e democrática e a rever o ofício docente, a
partir de problematizações acerca dos discursos, métodos, assuntos e materiais
utilizados em sala de aula. A produção de Rojo é resultado de estudos em torno
dos letramentos, de indagações envolvendo a alfabetização e letramentos e de
oportunidades de elaborar materiais e exercícios para os estudantes.
Inicialmente, Rojo
apresenta as relações entre os problemas sociais e familiares e os resultados
negativos da educação, demonstrando por meio de números que a escola no século
XX manteve realidades de exclusão e de fracasso com os meios populares. Apesar
de existirem casos de sucesso escolar, entramo-nos no século XXI com um amargo
sabor de níveis de leitura e escrita bastante limitados, o que revela que “temos pelo menos metade da população ainda
muito longe da realidade de uma escolaridade de longa duração que possa ser
tomada como uma experiência significativa e rica, ao invés de um percurso de
fracasso e exclusão.” (p. 23). Mesmo com algumas melhorias na educação
brasileira nas últimas décadas, através de alguns programas de incentivos
governamentais, como o PNLD e o PROUNI, ainda caminhamos em passos lentos. Ou
seja, há um avanço nas condições de acesso, mas sem condições de permanência
satisfatórias.
No terceiro capítulo,
intitulado Letramentos da população
brasileira – alfabetismo funcional, níveis de alfabetismo e letramento(s), Roxane
apresenta as concepções de alfabetismo e alfabetização e discute os variados
eventos de letramento com os quais nos envolvemos diariamente em diversos
espaços. A escola, nesse contexto, além de ser a principal agência de acesso à
cultura letrada pode e deve ser um ambiente de incentivo e de promoção da
democratização do acesso a outros espaços culturais, como o cinema, teatro e
museu.
Em seguida, a autora
problematiza as relações entre os sons da fala e as letras da escrita,
afirmando que “a ortografização é um
processo difícil e longo.” (p.68). Ela faz questionamentos acerca das
variadas formas que lemos e escrevemos e lança atividades para os(as)
professores(as) realizarem de modo a pensar as variedades sócio-lingüísticas
que possuímos.
No quinto capítulo,
Rojo retoma a discussão em torno dos níveis de alfabetismo, visto que este é um
conceito complexo e que envolve competências e habilidades dos sujeitos no
exercício da leitura e escrita. Ela lembra que o ato de ler vai muito além da
transposição de um código (escrito) a outro (oral), compreende um processo de
interpretação e atividade cognitiva de compreender o texto. A autora menciona
também que as mudanças de conjuntura sociopolítica por causa das novas
tecnologias de informação e globalização contribuem para o crescimento de
processos educacionais para a profissionalização. São muitos os discursos que
chegam até nós e são muitas as necessidades de lidar com eles no mundo do
trabalho e fora dele. Por conta disso, “ensinar
a usar e a entender como a linguagem funciona no mundo atual é tarefa crucial
da escola na construção da cidadania, a menos que queiramos deixar grande parte
da população no mundo do face a face, excluída das benesses comunicações
rápidas, da tecnoinformação e da possibilidade de se expor e fazer escolhas
entre discursos contrastantes sobre a vida social.” (MOITA LOPES E ROJO,
2004 apud ROJO, 2009, p. 89). Certamente, é preciso dar conta das demandas da
vida, da cidadania e do trabalho numa sociedade globalizada e recheada de
discursos.
No último capítulo, Letramentos(s), práticas de letramento em
diferentes contextos, Roxane traz reflexões acerca dos letramentos que se
apresentam e se chocam em diferentes ambientes e tempos, carregados de maneiras
e discursos próprios. Para essa discussão, a autora apresenta as diferenças
entre alfabetismo e letramento, afirmando que dentre alguns elementos, o
alfabetismo compreende as capacidades e competências cognitivas e lingüísticas,
enquanto que os letramentos são práticas sociais de linguagem. Em seguida, ela
apresenta a importância da obra de Street (1984) para os novos estudos sobre
letramentos, trazendo o entendimento do enfoque autônomo, que vê o letramento
em termos técnicos, e o enfoque ideológico, que vê as práticas de letramentos
relacionadas às estruturas culturais e de poder da sociedade.
A autora cita Magda
Soares (1998) e o que esta chama de versão forte e fraca do conceito de
letramento. A versão fraca estaria ligada às necessidades das estruturas
econômicas de uma sociedade de controle e neoliberal. Já a versão forte tem a
característica de ser revolucionária e ligada a uma não adaptação social.
Ela traz ainda o
pensamento de Hamilton (2002) sobre as distinções entre os letramentos
dominantes (associados a organizações formais, tais como a escola, as igrejas,
o trabalho, etc.) e os letramentos vernaculares (não regulados e controlados
por instituições). Essa discussão foi levantada por Rojo na análise do conceito
de letramentos múltiplos, considerando-os a partir das culturas locais e
espaços variados de ler e pensar o mundo. Dessa forma, a autora enfatiza a
importância da escola em promover o diálogo entre os textos de diversas
culturas locais com os das culturas valorizadas, de modo a potencializar o
diálogo multicultural.
A obra de Roxane Rojo
apresenta os letramentos múltiplos de forma dinâmica e com as próprias
diversidades de práticas de leitura, através de textos, imagens, narrativas,
links de vídeos, etc. É uma obra que traz importantes contribuições para a
discussão em torno dos letramentos, que apresenta esse assunto para iniciantes
de forma tranquila e incentiva um debate valioso em meios acadêmicos. Rojo não
aprofunda uma discussão acerca dos gêneros multimodais e dos letramentos de
resistência, mas isso não diminui em nada a grandeza do livro, tendo em vista o
debate e a riqueza de informações que levanta.
Além disso, a produção é direcionada para professores, educadores e todos
que se envolvem de alguma forma com a educação, haja vista lançar uma série de
atividades que nos levam a mergulhar num compromisso vigoroso com o processo
ensino-aprendizagem.
Podemos dizer também que
a obra de Rojo nos faz refletir sobre o que entendemos da educação e do
conhecimento. As escolhas que se faz em sala de aula é carregada de
significados e discursos, muitas vezes contraditórios. “Essas escolhas nunca são neutras, nem impunes, pois o tempo escolar que
tomo como um objeto de ensino não será dedicado a outro; cada escolha presentifica
um dentre muitos outros perdidos.” (p 121). Por isso, se o entendimento é
de que a educação é um processo que deve promover a vida, não se exclui nem se
toma uma parte como verdade absoluta, silenciando as outras. E Esse caminho é
proposto por Rojo nessa produção.
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